segunda-feira, 27 de abril de 2009

O que lemos é realmente o que é mais importante?

"A redação estava elétrica", me disse um editor após a descoberta de Shannon Matthews, 9 anos, que esteve desaparecida por 24 dias em fevereiro de 2008. "Minutos após a publicação da história, nós assistimos os cliques subirem como um jorro de petróleo. Em apenas uma hora, nós recebemos 60 mil acessos!"

É assim que começa uma matéria publicada no UOL na semana passada que mostra uma mudança no jeito de fazer jornalismo. Agora, o que importa não é apenas a notícia mais relevante no momento. É o que rende mais clique no momento. O exemplo citado no texto acima foi realmente um sucesso.

O jornalismo sempre teve uma luta interna: quem define o que é notícia? O público, que “pede” as suas notícias ou os fatos mais importantes? Pelo visto, seguindo a idéia de que o melhor é o que rende mais clique, temos um jornalismo dominado pelo público, muito mais democrático e que leva aos leitores o que eles realmente querem saber!

Isso fica muito bonito na teoria. É a utopia da democracia e da liberdade dos leitores. Só será estampado nas manchetes dos sites o que os internautas quiserem. Nada de domínio de editor-chefe. Mas, na verdade, isso parece ser mais uma grande distopia da sociedade moderna. Agora não é mais o editor-chefe quem define a hierarquia dos fatos da página principal. Agora quem assumiu esse papel foi uma maquininha, o conta-clique!

É simples! Se está dando mais clique, fica na home. Se não está indo tão bem, merece um destaque menor. Mas como podemos garantir que o que está “rendendo” mais é mesmo o mais relevante? Muitas vezes, uma notícia de um jogador de futebol tendo caso um mulher fruta dá muito mais clique que um texto sobre a crise econômica mundial. O que é mais importante para os cidadãos? Saber do caso de amor do astro dos gramados ou como anda a economia de seu país e saber defender a sua conta bancária?

A utopia da democracia e da liberdade dos leitores nem sempre contempla todos os assuntos. Os fatos mais estranhos, engraçados e com os melhores vídeos são os que rendem mais. Sei disso por experiência própria. Se ficarmos escravos e sendo controlados pela maquininha do conta-clique, nós, os jornalistas, vamos deixar de lado a nossa liberdade. Vamos esquecer de que temos função de informar a sociedade e equilibrar as notícias, entre o que é mais relevante e que dará mais audiência naquele momento.

As redações on line seguem cada vez mais o caminho do conta-clique. Afinal, quando a página está sendo bastante visitada, não é apenas a notícia que está sendo vista. Os leitores navegam pelas notícias, pelos anúncios, podem entrar em links. Tudo isso gera mais receita à empresa. Entretanto, é nosso papel lutar contra tal distopia e controle e lutar pela nossa utopia: a liberdade, a imparcialidade, o poder de edição. 

2 comentários:

  1. Os leitores são, sim, simpáticos a notícias consideradas de "menor relevância" pública. Quem os formou, no entanto? Tanto a imprensa quanto uma educação antiquada, nada crítica, que forma cidadãos passivos e os ensina a se enquadrar nos padrões de um pensamento hegemônico do capitalismo é que forma leitores igualmente passivos e superficiais.

    Diante deste quadro, os interesses econômicos vão continuar soberanos por um bom tempo...

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  2. (O correto)
    Os leitores são, sim, simpáticos a notícias consideradas de "menor relevância" pública. Quem os formou, no entanto? Tanto a imprensa quanto uma educação antiquada, nada crítica, que forma cidadãos passivos e os ensina a se enquadrar nos padrões de um pensamento hegemônico do capitalismo é que formam leitores igualmente passivos e superficiais.

    Diante deste quadro, os interesses econômicos vão continuar soberanos por um bom tempo...

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